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Uns meros ratinhos de laboratório

4 Maio 2016
Uns meros ratinhos de laboratório
Opinião
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Pare. Escute. Olhe.
Basta. Chega de culpas e desculpas.
Amancio Ortega, um dos Homens mais prestigiados do mundo, trabalhou a fio numa loja de tecidos, que incorporava confecção têxtil. Nas suas pausas para o almoço, sentava-se uma cadeira, situada na rua por forma a estimular a observação. Prestava especial atenção ao que as senhoras utilizavam naquele preciso momento e anotava. Sugeriu ao seu superior que começassem a ser produzidas peças na hora, de acordo com o que o mercado utilizava naquele exacto momento. O lema é “se as pessoas neste preciso momento optam por este registo, temos que nos adaptar. Não temos de aguardar pelas tendências da moda futuras, ditadas pelos grandes estilistas para produzirmos.” O tempo é agora. Vamos trabalhar para o que existe agora. Ele parou, escutou, olhou, produziu e venceu. E continua a vencer e a convencer. É necessário muita agilidade cerebral, financeira e postural para haver uma adaptação contínua às necessidades do mercado. Ainda hoje o Grupo Inditex mantém esta política. Se formos frequentemente à cadeia de lojas vamos perceber que as peças mudam quase todas as semanas. Existe um cruzamento de dados na sede (Corunha) que manipula toda a informação global e que garante que estejam a ser produzidas as peças certas, com as tonalidades mais desejadas, para serem vendidas no local com procura desse produto, na hora certa. Isto é Marketing puro e duro. Se desdobrarmos a palavra Market+ing percebemos que é o estudo continuado do mercado. O Continente tem sido um dos maiores fenómenos ao nível do estudo do comportamento do consumidor, com a utilização que é feita do seu cartão de cliente. Experimentem comprar vários produtos da gama de bébé (fraldas, toalhitas, colónias) durante uns dias e vão reparar que na próxima carta com promoções aparecerá a imagem de um recém nascido. A informação passada informaticamente é que vamos ser mães/tias/avós. Somos arduamente estudados até quando compramos coisas com os nossos recursos, para a nossa casa. O Cartão Continente é o intermediário entre o nosso lar e os escritórios da Sonae.
Marketing não é Publicidade nem sequer anúncios nos media. Isso são apenas formas de as marcas comunicarem os seus produtos com os consumidores. É apenas uma fatia de todo um bolo. Até nós, nas nossas relações pessoais, somos Marketers. Claro que, como em tudo na vida, uns têm mais aptidão que outros. Quando estamos numa discussão ou conversa, tentamos sempre vender o nosso peixe e fazer passar a nossa opinião. Tentamos sempre persuadir o recetor da informação. Todos nós gostamos de ser ouvidos e que as pessoas gostem de nós. E na vida, como no Marketing, tudo é um jogo de sedução. E um turbilhão de emoções ao barulho.
Um dos melhores exemplos do alto impacto do Marketing ao nível empresarial são os clubes futebol, no caso português. Escrutinando: são empresas, possuem um logótipo (emblema), vendem produtos ou serviços (bilhetes, quotas, kits). Nós somos os consumidores. Conseguem com que sejamos fiéis, aliás, leais. Há quem morra por amor à marca, perdão, ao clube. Não trocamos de clube a vida toda (salvo raras excepções) mesmo que não vença. “Era o que mais faltava, sou até morrer!” É uma ofensa dizer que somos de um clube adversário. Mesmo que estejamos a pagar e não usufruamos continuamos a ser deste ou daquele clube. Imaginam-se a proferir este discurso e a terem esta atitude para mais alguma marca? Isto é o sonho de qualquer marca. As marcas deixam de ser das empresas. As marcas são dos consumidores. A título de exemplo, existem os Canon Lovers e os Nikon Lovers. São duas tribos opostas que defendem as duas marcas e competem arduamente porque uma é melhor, a outra é pior e vice-versa. Incomodam-se, chateiam-se e, lá no fundo, ambas as máquinas são constituídas por peças provenientes do mesmo fabricante. Temos que parar e perceber que, efectivamente, podemos estar fidelizados a marcas por vários motivos – status, empatia, qualidade – mas tenhamos consciência que tudo isto foi pensado e estudado previamente e que devemos estar alerta para não sermos defraudados.
Pare, escute, olhe e pense que, no caminho desde o parque de estacionamento do Marshopping até ao centro comercial, na linha da loja Hussel, existe o aroma a chocolate. Em alguns centros comerciais onde esta presente a cadeia McDonald’s, os parques de estacionamento estão vaporizados com os aromas característicos para estimularem a gula por um hambúrguer. Em determinadas lojas há até várias formas de convencer o nosso cérebro a “sentir-se em casa” e até a temperatura de determinados provadores está no “ponto” para que levemos as peças de roupa que estamos a provar sem pensar. Apreciem o marketing sensorial, mas com bom senso.
Admirem o produto como uma commodity. Produto despido de enfeites.
Toda esta estimulação de venda minuciosamente pensada é brilhante. E nós somos os ratinhos, mas, ao menos, conheçamos as regras do jogo para que sejamos ratinhos atentos.

Ana Rita Costa