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Vai à Merkel

23 Setembro 2016
Vai à Merkel
Opinião
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E o Presidente Marcelo também foi. A sociedade contemporânea constrói-se assim. Tomando o pulso uns dos outros, quer nos corredores das chancelarias, quer no confronto directo e activo da vida diplomática. O Bloco de Esquerda, ao tempo do outro Governo, dedicou-se ao discurso hipócrita, ridicularizando constantemente esta diplomacia de encontro e diálogo. Com António Costa, agora no Governo, calou-se. A classe política, duma ponta à outra, é diversificada. Sujeita ao insulto, à crítica, à chacota, poucas vezes, ao apreço. E nas mãos de alguns, de facto, a política é cafetona. Intoxica-nos com promessas que nunca acontecem. De raras vezes olham o interesse do povo ou tentam remar na direcção dos destinos desse mesmo povo. Ir à Merkel foi a primeira atitude que F. Hollande tomou, contrariando todo o discurso político anterior à sua eleição. A Grécia foi lá várias vezes e sempre que regressou ao areópago veio mais pedinte e humilhada.
A retórica parlamentar não significa mentira. Tem um estilo próprio. Por vezes, acento azedo como revela a peça romanesca que, em 1866, Camilo Castelo Branco, escreveu em “ A queda dum Anjo”. O deputado Calisto Eloi “tinha uma cavalgadura magra no corpo”. Era parolo, farelório, cultivava a caça às comendas. Casado com os interesses da morgada Teodora Barbuda Figueiroa, nunca teve hipótese de sair do seu oportunismo provinciano e “ir à Merkel civilizar-se”. Quando chegou a Lisboa, após ter deixado Trás-os-Montes, a queda foi fatal. Hoje também os políticos, perdidos em “virtuosas parvoiçadas”, esquecem e atraiçoam o progresso do País. A sátira camiliana tem a sua actualidade, embora o contexto sócio cultural do século dezanove seja diferente do nosso. Actualmente o Parlamento não é uma reserva de gente iletrada, contudo assistimos a virtuosas hipocrisias que ultrapassam o perfil cultural de Calisto Eloi que, apenas, recusa modernizar-se perante o progresso da capital. Hoje o comportamento parlamentar é pérfido. Não é combativo. É oportunista. Infelizmente, nem sequer “puxa a brasa à sua sardinha” porque vive de truques. Esquece a defesa dos interesses colectivos.

Pe. Bártolo Pereira