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Raul Brandão – Os Homens do Mar

4 Maio 2017
Raul Brandão – Os Homens do Mar
Opinião
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Faz 150 anos que nasceu o romancista Raul Brandão (1867-1930), na Foz do Douro, com o mar a encantar-lhe os olhos. A vida dos homens do mar sempre o apaixonou. Os seus escritos, sobretudo “Os Pescadores” (1923) e “Ilhas Desconhecidas” (1927), são uma cantata aos costumes e tradições piscatórias da gente do mar, desde o Minho ao Algarve. Este romancista da literatura de ficção narrativa, diz o crítico David Mourão Ferreira, foi o primeiro a substituir a chamada “literatura de tese” por “literatura de problemática”. A “literatura de tese” é a que se prende com os problemas de ordem psicológica e social, que o homem pode solucionar, através da sua liberdade. A “literatura de problemática”, interessa-se pelo destino do homem, agitando, mesmo, questões de consciência. (“História da Literatura Portuguesa” de António José Barreiros).
Vila do Conde é terra de mar e de muitos problemas com ele relacionados. Estou a pensar nas Caxinas. Monsenhor Domingos, pároco dessa povoação, traça o perfil do homem do mar. Um homem de movimento. Tímido em terra, ousado no mar. É a pescadeira que segura o dinheiro no governo da casa. Entrega-se a ela na base dum pacto muito bem calhado entre marido e mulher e entre os dois, sobram os filhos, tudo numa harmonia quase perfeita.
Nos 150 anos do nascimento de Raul Brandão, escritor da “literatura de problemática”, somos obrigados a olhar o mar. Ao contrário da terra, não engole ninguém. Nós é que pagamos as favas quando pomos o pé, onde não há pé. Naufragar no mar é pleonasmo. Naufragar em terra é um empecilho que desassossega toda a gente e ninguém está disposto a deitar a mão aos descuidos terráqueos. Cada um deve desembaraçar-se “no barquinho frágil onde, contra a nossa vontade, nos fizeram entrar”. Assim escreve Mia Couto, outro homem de letras, habituado a dialogar com a água dos grandes rios que “morrem no mar sem nunca acabar de morrer”.

Pe. Bártolo Pereira