Os criadores de caprinos do sotavento algarvio atravessaram um 2022 “muito complicado”, que obrigou até a reduzir efetivos nos rebanhos, mas encaram 2023 com “mais otimismo” devido às chuvas e ao aumento de preços pagos ao produtor.
Nuno Coelho, produtor de cabras de raça algarvia, disse que, em 2022, a seca e a falta de água trouxeram um aumento de custos com a compra de rações para fazer face à falta de pastos e forragens e “levou muitos produtores a reduzir o rebanho”.
“No meu caso, tinha cerca de 120 animais e tive de reduzir o número de animais para cerca de metade. Agora tenho à volta de 60”, afirmou, revelando que o ano de 2022 “foi negativo” para as suas contas, tendo ficado “cerca de 35% abaixo” do rendimento obtido num ano normal.
Nuno Coelho tem a sua produção de cabras de raça algarvia localizada em Alcoutim, no nordeste algarvio, uma das zonas mais desertificadas e envelhecidas do país, e isso torna a atividade “mais complexa”, devido à falta de mão-de-obra e ausência de estruturas como matadouros, pelo que um aumento de custos ameaça a continuidade das explorações de caprinos autóctones.
Apesar de, nas últimas semanas, “os preços da rações terem baixado um pouco” e de os produtores estarem a receber mais por litro de leite (passou de cerca de 60 cêntimos para 80) e quilograma de carne (de cinco para sete euros), a elevada idade dos produtores e a falta de matadouro no Algarve dificultam a manutenção da atividade.
“Os preços de ração baixaram um pouco, mas ainda há custos elevados com gasóleo ou eletricidade”, assinalou, frisando que “não se augura grande futuro para a cabra de raça algarvia”, por ter “uma produção de leite intermédia” e com “interesse especialmente pela qualidade do leite”, já que “ao nível de produção de carne está equiparada a outra raça qualquer”.
Para valorizar a cabra de raça algarvia e manter os benefícios de “um maneio extensivo”, menos rentável que o intensivo, Nuno Coelho considera necessário avançar para a criação de uma denominação de origem, mas lamentou a “falta de empenho” por parte das associações do setor e regionais em avançar nesse sentido.
“Seria também importante criar um centro de abate mais no sul do país. Esteve para sair qualquer coisa com os dinheiros da ‘bazuca’ [Plano de Recuperação e Resiliência – PRR], falou-se na criação de um novo matadouro no Algarve, mas tudo ficou em águas de bacalhau”, considerou.
Segundo Nuno Coelho, o local mais próximo de Alcoutim onde abateu animais foi a cerca de 300 quilómetros de distância, em Santarém, uma vez, porque as restantes foram em Braga, Famalicão ou Guimarães, exemplificou.
Outro produtor do sotavento (leste) algarvio, com cerca de 330 cabras, também disse que a situação “agora já melhorou um bocadinho” comparativamente com o ano anterior, porque “já há umas pastagens” depois das últimas chuvas e “as charcas que estavam todas secas já têm água”.
Esta alteração permite que os criadores consigam “dar um bocadinho de ração e alimentar os animais no campo, mantendo a mesma produção”, apesar de “a eletricidade ter aumentado e o gasóleo estar muito mais caro”.
“A coisa não está muito boa, mas melhorou”, disse este produtor, recordando que “as pastagens e o cereal semeado, no ano passado, nem nasceram, e as coisas este ano estão diferentes”.
O aumento dos preços pagos ao produtor permitiram que um cabrito rendesse “em média mais 10 euros” do que no início de 2022 e isso ajuda a equilibrar contas, permitindo fechar o ano de 2022 “sem ganhar, mas também sem perder”.
Nuno Luís garantiu que sempre viveu deste ofício e quer manter a tradição familiar de criar cabras, iniciada pelo avô e prosseguida pelo pai, mas reconheceu que, “se for para perder dinheiro, é melhor acabar” com o negócio.
“Para chegar ao fim do ano e ter prejuízo, não vale a pena”, afirmou, reconhecendo que pensou em fechar a atividade em 2022 por ter 45 anos e possibilidade de trabalhar noutros locais, mas as melhorias registadas nas últimas semanas levam-no a olhar para o futuro próximo com “mais otimismo” e a “manter, por enquanto, a atividade”.