Uma equipa da Universidade de Aveiro (UA) descobriu que as amêijoas asiáticas conseguem limpar águas poluídas, nomeadamente uma das mais poluentes indústrias do sul da Europa: a da produção de azeite. Apesar de serem uma espécie invasora, e destruírem gradualmente os ecossistemas ribeirinhos nacionais, podem ser muito úteis na hora de despoluir águas.
Joana Pereira, investigadora do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM), uma das unidades de investigação da Universidade de Aveiro (UA), apresentou duas perspetivas que se deve ter em consideração, devido ao facto de estas serem uma espécie invasora.
Estas amêijoas asiáticas têm a capacidade de remover metais e compostos orgânicos recalcitrantes. Compostos estes que não são biodegradáveis ou de difícil biodegradação, como por exemplo, os que se encontram nos efluentes da indústria de produção do azeite.
A cientista responsável pelo estudo sublinhou que estes bivalves conseguem extrair “matéria orgânica no geral, bem como remover bactérias e vírus potencialmente patogénicos se integradas em determinadas fases dos processos de tratamento de água”, acrescentando que “estes efluentes deverão ser tratados, mas os sistemas de tratamento mais eficazes são ainda bastante dispendiosos e difíceis de manter dada a sazonalidade da produção”.
Quanto à indústria de azeite, todos os anos “a quantidade média de efluentes provenientes da indústria do azeite pelos países mediterrâneos equivale a cerca de 30 milhões de toneladas”. Isto significa que “o impacto ambiental de um metro cúbico desses efluentes equivale ao impacto de 200 metros cúbicos de efluentes domésticos”.
Apesar do encaminhamento destas águas para tratamento ser feita de maneira correta, tornou-se “fundamental continuar a desenvolver soluções de tratamento eficazes e economicamente e ambientalmente sustentáveis”, explicou Joana Pereira.
As amêijoas asiáticas não só possuem taxas de filtração elevadas, como também são tolerantes a condições ambientais adversas, como as que decorrem da contaminação.
A investigadora referiu as eventuais vantagens que este organismo possui por ser resistente e tolerante a contaminantes.
“A tolerância a contaminantes problemáticos pode relacionar-se com as capacidades de acumulação deste tipo de compostos que as amêijoas têm e com a possibilidade de concentrarem os contaminantes nas pseudofezes que libertam para o exterior sob a forma de massas mais densas que a água, que por isso ficam depositadas nos fundos”, acrescentou.
Ainda que a utilização das amêijoas asiáticas se encontre numa fase embrionária, prevê-se que venha a apoiar métodos de tratamento de água já existentes, nomeadamente em etapas do processo de tratamento de águas residuais em Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR). Joana Pereira explicou a integração dos organismos nos sistemas de tratamento.
Teoricamente, a investigadora da Universidade de Aveiro (UA) apontou que a amêijoa asiática pode ser utilizada “em todos os cenários em que haja uma matriz aquática a tratar”.
Hipoteticamente “poderá adaptar-se esta ideia a estações de tratamento de águas residuais e de águas para consumo humano, mas também, entre muitos outros locais”.
Além da elevada tolerância a contaminantes problemáticos, estes organismos possuem duas vantagens relativas a produtos convencionais. Em primeiro lugar, constituem uma solução biológica que poderá substituir a utilização de um ou mais químicos no sistema de tratamento ou pelo menos diminuir as dosagens de utilização desses químicos, com vantagens óbvias sob o ponto de vista económico e ambiental.
Em segundo, “é dado um uso a uma espécie invasora que precisa de ser removida dos nossos ecossistemas aquáticos em iniciativas de controlo, o que pode compensar os gastos efetuados para essa remoção beneficiando, de uma forma geral, a sustentabilidade [incluindo a económica] dos programas de gestão desta espécie invasora”, apontou Joana Pereira.
O trabalho publicado no Journal of Cleaner Production também tem assinatura de Ana Domingues, Inês Correia Rosa, João Pinto da Costa, Teresa Rocha-Santos, Fernando Gonçalves e Ruth Pereira, numa parceria entre o Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM), os departamentos de Biologia e de Química da Universidade de Aveiro (UA) e a Universidade do Porto (UP).