Quando era miúdo, aí com meia-dúzia de anos, os jornais lá de casa eram o «Primeiro de Janeiro» e o «Renovação». Do primeiro recordo as tiras de banda-desenhada que o meu avô David recortava e compilava, fazendo pequenos álbuns com que me deliciava. Já o segundo era aquele em que o meu avô assinava uma coluna de opinião, onde revivia a sua infância e juventude, ilustrando-a com episódios de costumes tradicionais e personagens coloridas da sua terra natal, Vila Chã.
Não imaginava sequer que, anos depois, estaria a partilhar a minha opinião em vários jornais, chegando ao ponto de ser director de um, aqui em Vila do Conde. Mas tudo passa e, depois, desses tempos fantásticos, uma década e meia vivida com uma intensidade que me preenchia, acabei por parar. Porque para tudo há um tempo.
E volto agora, pelo gentil convite do Artur do Bonfim, porque, para mim, escrever no «Renovação» não é apenas escrever numa qualquer publicação. É religar-me a um passado que já só existe na minha memória. É a minha vã tentativa de voltar à mesa da cozinha onde repousava o correio e levar o «Renovação» ao meu avô, apontando-lhe, orgulhoso, o seu nome que eu havia descoberto no meio de tantas letras e palavras. O «Renovação» partiu e o meu avô também. Mas ainda fui a tempo de recolher os seus escritos num livro que fiz publicar em edição de autor, e que intitulei “DA VIDa”, num jogo de palavras em que quis fazer a ponte entre o homem e a obra.
Mas se o meu avô jamais voltará, o «Renovação» desafia a lei da Vida e está de regresso. Adaptado aos novos tempos digitais, não está contido a Vila do Conde, podendo ser lido em qualquer parte do Mundo e ficará armazenado, talvez para sempre, nas nuvens cibernéticas que, esperemos, jamais se transformem em tempestade…
Lançar um jornal numa época onde o efémero parece ser a regra por via da velocidade comunicacional, onde o vazio lipovetskiano é adorado nos altares das televisões e onde, pura e simplesmente, ninguém pára um segundo para reflectir, só pode ser obra duns irredutíveis vilacondenses, dotados duma fé inquebrantável em que vencerão um inimigo de proporções épicas. E fazem muito bem, porque dos fracos não reza a História.
Vamos lá, então, «renovar».