Última hora

Supremo Tribunal de Justiça valida condenação de juiz de Famalicão por violência doméstica

25 Maio 2021
Supremo Tribunal de Justiça valida condenação de juiz de Famalicão por violência doméstica
Local
0

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a condenação de um juiz de Vila Nova de Famalicão a 20 meses de prisão, com pena suspensa, por violência doméstica sobre a ex-mulher.
No acórdão, datado de 20 de maio, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) mantém também a condenação do arguido, Porfírio Vale, a pagar uma indemnização de 15 mil euros à vítima.
A suspensão da pena vigora por dois anos e está sujeita ao regime de prova, tendo ainda o arguido de frequentar uma formação sobre prevenção de violência doméstica.
Cristina da Silva Leal, advogada da vítima, disse que este acórdão é “um sinal de esperança para todas as vítimas da violência emocional e psíquica, e prova ainda o respeito dos tribunais portugueses pelos direitos humanos das mulheres”.
“Apesar das patologias investigatórias que caraterizaram este processo, fez-se boa justiça, e este acórdão veio reforçar a decisão do Tribunal da Relação do Porto, o que é uma enorme alegria porque põe fim a um longo período de tortura e massacre psicológico e psíquico de enorme gravidade do ponto de vista da privação dos direitos fundamentais da minha constituinte”, acrescentou.
O arguido e a assistente estiveram casados durante 10 anos e têm um filho menor, tendo o divórcio ocorrido em finais de 2015.
O tribunal deu como provado que, após o divórcio, o arguido, a pretexto de resolver questões relacionadas com o filho e com a divisão dos bens do casal, “atormentou” a ex-mulher com e-mails e centenas de mensagens de telemóvel (SMS).
As mensagens, diz o tribunal, “infiltram-se em aspetos da vida privada da ex-mulher, em valorações sobre os seus comportamentos e em comentários desprimorosos sobre aspetos da sua personalidade”, referindo-se, designadamente, às suas saídas noturnas e à sua presença em festas com amigos.
O tribunal alude a “variadíssimas exigências, recriminações, ameaças, apartes jocosos e utilização do filho como instrumento de pressão psicológica ou de instilação de sentimentos de culpa” na vítima.
Relata uma “ofensa reiterada e persistente” sobre a saúde psíquica, emocional e moral da vítima, traduzida num “constante importunar” e numa “reiteração de ameaças, mesmo veladas, com exibição de controlo e domínio sobre a liberdade, o ambulatório, o trem de vida e a privacidade”.
Lembra que a ofendida foi “parceira de vida” do arguido e que, também por isso, merecia “particular respeito e sensatez de atitudes”.
Para o tribunal, o arguido pretendia “comandar” o comportamento da ex-mulher, “levando-a a fazer o que ele queria”.
“Queria exercer ascendente a que não tinha direito”, sublinha o acórdão, acusando ainda o arguido de querer “culpabilizar, menorizar, incomodar, intimidar, ridicularizar e moer” a ex-mulher.
O tribunal diz que algumas mensagens revelam ciúme e “incapacidade” do arguido para aceitar do divórcio.
Na ponderação da pena, o tribunal valorou não só a repetição dos atos e o número “considerável” de mensagens “violadoras da saúde psíquica” da vítima, mas também o facto de o arguido ser juiz, o que confere “um significado mais desvalioso aos seus atos”.
Diz que um juiz tem “particulares deveres de urbanidade, de reserva e de exemplaridade de comportamento social”, criticando o arguido por ter atentado contra “o valor dos valores, relativo à dignidade da pessoa humana”.
Em novembro de 2020, o arguido já tinha sido condenado no Tribunal da Relação do Porto, mas recorreu, alegando erro notório na apreciação da prova e pedindo a nulidade do acórdão e consequente absolvição.
Dizia que as mensagens eram apenas “manifestações de desagrado, desabafos e remoques”, próprias de um “pai extremoso” preocupado com a alegada negligência com que a ex-mulher trataria o filho de ambos.
Aludia ainda “à mais pura demonstração de um comportamento humano, misturando racionalidade e emotividade, raciocínio e emoção”, insuscetível de configurar ofensa à integridade psíquica à vítima.
Argumentos que não colheram efeitos junto do Supremo Tribunal de Justiça, que manteve a condenação do juiz.