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Crónica de um centro hospitalar de… província

6 Setembro 2017
Crónica de um centro hospitalar de… província
Opinião
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Caros leitores, é duro para quem tem uma vida super ativa ter de passar vários dias hospitalizado.
Aos primeiros sintomas, num final de tarde do dia 17 de Agosto de 2017, de que algo me estaria a ocorrer, com uma sensação de paralisia no braço esquerdo e que se entendia da mão até á face, fui no INEM ao hospital de S. João onde feito um tac me foi detetada uma pequena lesão cerebral. Aí disseram-me que a lesão estaria estabilizada e que teria de fazer mais exames complementares para se concluir se a lesão seria de origem primária ou secundária.
Como este hospital não é o de referência da minha área de residência para fazer esses exames fui transferido para a Póvoa de Varzim às 4 horas da manhã e daqui para Vila do Conde às 10 da manhã.
Como era fim-de-semana só marcaram os exames para a terça feira seguinte e assim andei durante mais dezoito dias a fazê-los até ser transferido novamente para o S. João onde o meu problema concreto está a ser tratado.
Quando cheguei ao S. João, para azar meu, foi-me diagnosticada uma bactéria hospitalar, em princípio provocada pelo meu internamento em Vila do Conde, o que me leva a estar em isolamento durante mais uns dias.
A dúvida que se me coloca é a seguinte: se eu já estava num hospital da especialidade onde tudo podia ser feito, porque andei de Anás para Caifás para ter de voltar ao S. João? Perda de tempo, de energias e gastos para o estado, concluí, além de atrasos para a minha saúde.
Mas o que eu quero realmente testemunhar, pois só sente as coisas quem realmente passa por elas, foram os dramas que eu passei em Vila do Conde. Não querendo enfatizar nos pormenores, pois poder-se-ia facilmente concluir que em vez de um hospital estaria num hospício, tantas foram as situações que nestes dias por aí passei.
Vivi situações dolorosas, noites traiçoeiras, senti a fragilidade humana na sua mais elementar condição.
Concluí que o centro hospitalar Póvoa de Varzim/Vila do Conde tem poucas condições para atender os diferenciados doentes consoante o seu estado clínico.
Tive que conviver cama a cama, lado a lado, com doentes terminais que a meu lado acabavam por falecer passadas algumas horas de terem entrado, com doentes portadores de deficiência que teriam de estar acompanhados por familiares, com indigentes carenciados de necessidades básicas, outros com demência que não sabiam onde estavam, se era noite ou dia, alguns com obrigatoriedade de “isolamento” sem haver espaço para eles e outros, como eu, que só aqui estavam em controlo e despiste de doenças, à espera de ir para o hospital da especialidade tratar do seu caso concreto.
Mas também queria, e, acima de tudo referenciar, o carinho e o amor com que somos tratados pelos profissionais de saúde. Procuram fazer o melhor pelos doentes, alguns destes entrando em situações bastante difíceis, até parecendo inicialmente incontroláveis, mas os médicos e os enfermeiros com mestria e competência as iam estabilizando.
Temos excelentes profissionais de saúde, desde os médicos, enfermeiros até ao pessoal administrativo e auxiliar. Só não temos um centro hospitalar com condições de se poder fazer mais e melhor e um sistema de saúde capaz de responder a todas as solicitações.
Então os dramas acumulam-se diariamente com constantes e novas situações. E eu procurando manter o meu nível emotivo e psicológico num estágio positivo, o que é bastante difícil com tantos doentes na mesma ala e em estados clínicos bastante complexos que provocam inesperadas reações.
Uma casa de banho para todos com a proliferação mais que evidente de focos infeciosos também não ajuda a um bom ambiente.
A doença tem e deve ser mais humanizada. O pessoal de saúde sabem-no fazer bem, não temos é hospitais que o permitam fazer melhor.
Faço aqui um aparte e pergunto: alguma vez alguns dos nossos responsáveis políticos, presidentes cá do burgo, passou por cá? Esteve alguns dias internado? Os profissionais de saúde dizem que nunca os viram. Têm clínicas privadas onde gastam o dinheiro que lhes “pagamos” para tratarem dos seus problemas de saúde rapidamente e sem terem de passar por isto.
Publicarei posteriormente mais um artigo onde, de uma forma mais “politizada”, abordarei os hospitais que temos aqui na zona e darei a minha opinião sobre o que se poderia ter e fazer.
Até lá, saúde para todos que eu estou a tratar da minha!

António Postiga