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O homem que se faz, fazendo a história

8 Julho 2016
O homem que se faz, fazendo a história
Opinião
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Nasceu a 28 de Janeiro, lá para os lados da Serra da Estrela, Melo, Gouveia, faz agora cem anos, Virgílio Ferreira (1916-1996). Escreveu uma mão cheia de romances, todos eles mergulhados na “sabotagem do tempo” que, tarde ou cedo, nos levará à morte. A problemática existencial de Virgílio Ferreira é um sério embaraço psíquico que o acompanha vida fora. Virgílio Ferreira é um escritor que percorre dois caminhos paralelo e faz muito assertivamente a passagem de um ao outro. De início, entusiasma-o a escola do Neo-Realismo que fundamenta a sua doutrina nos assuntos relacionados com os problemas sócio-económicos dos povos, numa afeição ideológica à luta de classes. O homem, na sua totalidade, tem implicações biológicas, psicológicas, mas também económicas. “É o homem que se faz e, ao fazer-se, faz a história”. O escritor neo-realista entra nesse combate, ajudando, efectivamente, “o homem que se faz, fazendo a história”. (“História da Literatura Portuguesa”, José Barreiros.) mas, depressa, a ansiedade romanesca de Virgílio Ferreira tomba para a transição de temas existenciais. A meio da sua produção literária começa a procurar a autenticidade do homem e a verdade da vida.
Dois romances, “Manhã Submersa” (1954) e “Aparição” (1959), apresentam primorosamente a problemática do homem metafísico, frente ao homem crente, sobre a finalidade da existência. “Quem sou?”. “Que estou cá a fazer?”. Numa primeira abordagem, os dois romances tentam solucionar os problemas através da pesquisa psicológica para, de seguida, mergulhar na procura da verdade ansiosa do Absoluto, onde vão parar todas as nossas inquietações. Perdido na dialéctica entre o “Eu” que o mascara e o tal Absoluto que o mascara, Virgílio Ferreira deixa-nos a seguinte perplexidade: “como há-de o homem redimir-se num mundo materializado, donde o Transcendente foi expulso”. (“Cântico Final” de 1960.) de facto, o fim e a finalidade desta “vida arrendada, passa para mais longe de nós”. Virgílio Ferreira é, acima de tudo, um escritor numa constante pesquisa interior. Homenagem, pois, a este grande senhor das letras portuguesas.

Pe. Bártolo Pereira