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O Papa Francisco calça 42

19 Novembro 2015
O Papa Francisco calça 42
Opinião
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A pouco e pouco, o Papa Francisco vai calcando o território da cristandade com suavidade e cautelas, mas aliviando sempre a pressão da moral e costumes instalados por zelo e deveres emanados da própria Igreja ao longo da história. Se o inferno é cá na terra, o Papa está no inferno.
Aplausos e críticas, dos mais variados quadrantes, o contemplam diariamente.
O Papa Francisco calça 42, com textura de borracha. Têm chegado a conta-gotas algumas reformas, cujo impacto na vida das pessoas concretas é notável. O mais difícil está para acontecer. O anúncio do Jubileu da Misericórdia, que começará em Dezembro é uma iniciativa que vai marcar profundamente toda a Igreja. A cultura da misericórdia ou do perdão é a alma de todo o mistério cristão. A Igreja não abandona ninguém. Nunca despreza experiências adquiridas, “rebaptizadas”. Não coloca pecadores contra justificados. O Papa Francisco é convidado, por inspiração, a mexer nos proscritos da Igreja: relação mais próxima com os divórcios, olhar mais atento aos conteúdos do aborto, da homossexualidade.
“Cada Homem é Uma Raça” (1990) é um romance de Mia Couto que ajuda a vestir o pensamento desta crónica. Vou ao conto romanesco da “Rosa Caramelo”, corcunda e abandonada à porta da Igreja, buscar a explicação. O amor e o perdão abraçam todos os humanos, “direitinhos ou corcundas”. A tipicidade deste personagem, a dita “Rosa Caramelo”, perdida no romance de Mia Couto, é uma referência ao milagre da perpetuidade do espírito de tolerância que vivifica a acção da Igreja em cada pessoa. No corpo da corcunda, isto é, na imperfeição de cada um, cruzam-se todas as experiências humanas. “Vivemos longe de nós, em distante fingimento. E é no aconchego dessa noite, de coração encolhido, que descansam os nossos fantasmas.” O pensamento de Mia Couto ajuda a compreender o passo apressado e generoso do Papa que calça 42.